Um país de trancas à porta

O mundo assiste diariamente a notícias de conflito e morte na Síria, expectante sobre uma possível intervenção militar do Ocidente, liderada pelos Estados Unidos. Entre Palestina e Israel, os diários desentendimentos e conflitos há muito que deixaram de ser notícia. Em destaque está, neste momento, que as duas partes estão dispostas a prosseguir negociações, agora se isso conduzirá a tréguas é que já é outro assunto. Mais a sul, neste conturbado Médio Oriente, a Península de Sinai, no Egito é também, com alguma regularidade, palco de notícias bélicas.

Neste emaranhado complexo, não admira que em Israel se viva uma paz tensa. Volta e meia, aviões e helicópteros militares riscam o céu azul da terra prometida e a toda a hora se vêem jovens militares armados em qualquer lugar.

Protagonista de uma história de perseguições, ao longo dos séculos, o povo judeu parece que vive numa casa de janelas abertas e ao mesmo tempo de trancas à porta. Sente-se a tensão diária com os países vizinhos e portanto a segurança é uma preocupação primordial.

Pelo que, o carácter militar de Israel é surpreendente. Sendo o serviço militar obrigatório para rapazes (três anos) e para raparigas (dois anos), ver um militar é tão frequente quanto ver um rabino com o seu uniforme tradicional; e estar armado é tão natural quanto ler os textos sagrados do Velho Testamento junto ao Muro das Lamentações. Os israelitas preservam muito o sentido de segurança, pelo que quem, por algum motivo, não faz o serviço militar é olhado de soslaio e no futuro terá certamente problemas em conseguir um emprego.

Militares em Jerusalém

Militares em Jerusalém. Foto: Gilberto Fontes

Todos os dias, nos momentos mais diversos e rotineiros se sente a presença de forças de segurança. Por exemplo, na entrada de espaços públicos, como num centro comercial, as pessoas têm sempre que passar num detector de metais e facilitar a fiscalização das bolsas ou outros pertences. Em viagens de autocarro, passando para território palestiniano e mesmo dentro de espaço israelita, são frequentes os “check points” ou pontos de controlo, nos quais o autocarro pára para que jovens militares armados entrem e verifiquem se está tudo nos conformes. Sendo tão vulgar, os militares parecem encarar a posição que ocupam com muita naturalidade, carregam armas como se fossem as do Carnaval e as raparigas claro, como em qualquer parte do mundo, gostam de recriar um toque feminino, trocando as botas grossas pelas sandálias ou optando pelo penteado de cabeleireiro em vez do cabelo apanhado.

Os israelitas são pessoas atentas, conhecedoras da sua história e religião e, portanto, por vezes também desconfiadas. Notou-se isso, por exemplo, em Jerusalém, quando perguntamos a uma jovem militar a que ramo das forças armadas pertencia, tendo em conta a cor da farda e da boina. A pergunta não foi bem recebida e suscitou o olhar desconfiado de um homem que, ao lado, escutava atendo. Não se contentando com a aparente simples curiosidade de um turista sobre o fardamento militar, disparou uma série de perguntas de modo hostil como se quisesse descobrir um espião dissimulado:  porque perguntas isso?; de onde vens?; que fazes aqui?; para que queres saber isso?; etc.
Claro que nem todas as pessoas são desconfiadas, a maioria tenta transmitir a imagem de um país em paz, contestando o preconceito de um Estado em permanente conflito com os seus vizinhos, veiculado pelos média.

Mas se a segurança já é apertada dentro do próprio país, para entrar e sair de Israel, o caso é ainda mais complicado. Inclusive o embarque para a viagem de regresso ficou por uma unha negra! Tal como todas as pessoas, fomos abordados por um funcionário de segurança no aeroporto que, com os nossos passaportes em mão, ia fazendo várias perguntas. Depois de uma série de questões, sobre a nossa vida pessoal, voltava junto do seu superior a quem fazia, suponho, um apanhado da situação. E regressava para mais uma série de perguntas: onde trabalha?; tem comprovativo de onde trabalha?; quando foi a última vez que se viram?; quando se tornarão a ver?; com que frequência se vêem?; etc etc.

Depois da terceira ronda de questões, chegou a vez do chefe de segurança fazer a prova dos nove. Voltou a repetiu perguntas, noutra ordem. Passámos no teste. E só depois de tudo ok, desatamos a correr! Entretanto o gabinete de “check in” estava a fechar e fomos as últimas pessoas a embarcar. Houve inclusive quem perdesse o vôo por causa dos procedimentos de segurança. Depois do susto, abri a mochila. Vi a garrafinha de água – enquanto em muitos aeroportos, os funcionários de segurança implicam com as garrafas de água e líquidos com mais de 100 ml, em Tel Aviv esse não foi o problema. Pareceu mais complicado explicar que duas pessoas foram passar férias juntas apesar de viverem em países diferentes.

Este tipo de problemas não é exclusivo de Israel, os países que consideram o Estado israelita como inimigo não recebem com bons olhos pessoas cujo passaporte já passou naquele país. Para evitar futuros problemas, muitas vezes Israel concede um visto num papelinho que fica à parte do passaporte. Assim, para o futuro é como se nunca tivesse estado em Israel.

6 thoughts on “Um país de trancas à porta

  1. manelpiroclasto diz:

    Penso que qualquer um de nós gosta de especular sobre politica global como o que vai fazer po jantar logo à noite, por isso mando aqui a minha fevera (febra):
    O que vai acontecer se uma guerra deflagrar no médio oriente? Se a guerra chegar a um tal ponto que o mundo árabe vai ficar desesperado ao ponto de não se importar já de atacar israel, pois o medo das represálias de guerra já não se põe, pois a guerra já é uma realidade. Árabes “kamikaze” não vão faltar.
    Tal é a minha ignorância da situação, talvez alguém aqui saiba mais da questão.

  2. Glorinha qual não é o meu espanto quando vejo que o teu último post é já de um ano atrás!!! E passado 1ano continua a fazer tanto sentido… Confirmo cada palavra que dizes! Vê lá se vais atualizando com mais histórias… Beijinhos

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